Ela havia acordado no meio da madrugada, no meio da escuridão. Estava suando. Percorreu a casa a procura de alguém dormindo, olhou cada cômodo, mas estavam todos vazios; então seu coração disparou e a boca abriu-se, desnorteada. Uma onda de desespero a dominara, devem ter me abandonado.
Não queria aceitar de jeito nenhum aquela idéia. O estado de choque a deixara sem reação, e agora ela parecia estar embriagada com a conclusão que havia chegado. Deu um passo desajeitado e de repente lembrou-se que estava havendo uma pequena comemoração em sua casa, um andar a cima; mas o sono havia chegado e ela não hesitou em ir para seu quarto. Lembrou-se exatamente de sua pequena família reunida ao redor de uma redonda mesa de vidro jogando papo fora, comendo petiscos e bebendo vinho. Exatamente como se faz nos dias frios.
Estava aliviada e com certa esperança; mas, infelizmente, como esperado, tudo converteu-se em terror ao terminar de subir as escadas. De uma porta entreaberta, viu um clarão abafado. Caminhou até ela e escancarou a detalhada peça de madeira. O salão estava lambido em fogo.
Covardemente, aquele cenário agora tomava conta de sua mente, sufocando suas esperanças. Não sabia como acontecera aquilo, mas o que estava diante de seus olhos era real. A vontade dela era mergulhar naquele mar vermelho para ver se encontrava sua família para tirá-la de lá ou para simplismente juntar-se a ela.
As chamas a chamavam, faziam um convite assustador. Irrecusável. Penetravam inconfundíveis os olhos da menina hipnotizada. Só precisava de um empurrãozinho para juntar-se eternamente em cinzas à sua família. Definitivamente.
Não estava decidida, mas não sabia o que fazer. Seu corpo magro inclinou-se para o grande monstro que a envolvia com seu hálito quente, mas antes que seu fim estivesse decidido, duas mãos firmes surgiram e a seguraram pelo braço com determinação e tristeza. Ela virou com uma expressão de pavor na face; pensava que era a única ali. Era seu pai, o olhar emocionado, o cenho desapontado. A filha retribuiu o olhar com lágrimas pesadas que faziam desenhos na face de porcelana.
Tinham que sair do meio daquele inferno, então o pai segurou a filha pela mão e começou a andar em direção à porta. Ela o acompanhou e deu uma última olhada para trás. Olhando seu rosto, podia-se ter certeza que estava se despedindo, não os veria mais. Deixou mais uma lágrima cortante cair e teve que partir.

Isabella Franca.